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Darcy Andozia, militante antirregime durante a ditadura militar, visita o
Ponto de Leitura Tide Setubal

A ditadura militar acabou há quase 30 anos, no entanto, muito ainda se discute sobre o tema no Brasil. Questões como a impunidade de muitos agentes desse regime estão até hoje em pauta em diversas esferas da sociedade, gerando muita polêmica. É fruto dessas discussões a instituição da Comissão da Verdade, que investiga a fundo violações dos direitos humanos praticadas pelo Estado brasileiro durante o período que compreende de 1946 a 1988, abarcando todo o período da ditadura militar, e da Lei de Acesso à Informação, no ano de 2011.

Comemorando o aniversário de promulgação dessas medidas, o Sistema Municipal de Bibliotecas da Prefeitura de São Paulo preparou a série de encontros A Luta é Contínua, no qual militantes contrários ao regime antidemocrático visitam bibliotecas e pontos de leitura ao redor da cidade para contar suas experiências durante o período.

O Ponto de Leitura Tide Setubal, no CDC, recebeu, no dia 7 de maio, a visita de Darcy Andozia, pedagoga, militante no Movimento da Igreja Católica dos Dominicanos da Ação Popular. Ela foi recebida por um grupo de jovens do projeto Arteculturação, mais especificamente do grupo de teatro, além de representantes de ONGs e moradores da região.



Os jovens do teatro do CDC se interessaram pelo encontro, pois já vinham tratando do tema em suas oficinas, conta Marcos Gomes, 32 anos, educador do grupo. No semestre passado, o grupo preparou cenas inspiradas nas torturas da ditadura. “Quando soubemos que a Darcy viria, ficamos todos ansiosos. Os jovens pesquisaram a biografia dela e pensaram em perguntas para fazer”, diz ele.

Darcy contou aos participantes ainda se emocionar muito ao ver imagens da ditadura, período em que não apenas ela, mas toda a sua família sofreu com a perseguição política. Seu filho, Carlos Alexandre, na época com 1 ano e 8 meses, também foi “preso” pela ditadura e torturado. Ela relata ter começado sua mobilização política antes mesmo da ditadura. Na escola onde estudou, Darcy lutou contra a discriminação social e racial e, inclusive, conquistou outros estudantes contra as injustiças observadas em sua escola. Então veio a ditadura militar e Darcy, já engajada desde a escola com a mobilização política, opôs-se ao regime e ingressou na luta armada.

Seu papel dentro do movimento era organizar grupos pela educação popular e orientá-los e prepará-los para a luta armada. A pedagoga contou ter aprendido a usar armas, mas que seu trabalho era basicamente de orientação e, portanto, nunca saiu em uma luta armada. Uma de suas funções era também levar recados entre os membros do grupo. Ela saía com seu filho ainda de colo e, em locais previamente combinados, deixava cair o sapatinho da criança com as mensagens.

Darcy Andozia foi presa, acusada de difamar o país em trabalhos que fazia e encaminhava ao exterior. Seu filho, então com 1 ano e 8 meses, também foi preso, apanhou e teve a boca cortada.

Em fevereiro deste ano, Darcy perdeu o filho que, aos 40 anos, cometeu suicídio. Para ela, a ditadura não matou seu filho, mas deixou sequelas psicológicas com as quais ele não conseguia lidar.

O encontro foi conduzido pelas perguntas feitas pelos jovens para Darcy. Távio Mendes, do grupo de teatro do CDC, disse ter gostado muito do encontro com Darcy. “Deu para entender perfeitamente tudo sobre a ditadura militar. Obrigado por mais uma porta aberta para o conhecimento”, disse ele.

Daniele Marques, 18 anos, gostou principalmente de ouvir sobre a ditadura de alguém que viveu o período. “A gente só sabia desse período por livros ou por professores”, conta ela. Foi isso também que mais atraiu Bela Tainá: “Eu só sabia o básico sobre a ditadura, o que é passado na escola. Com a visita da Darcy, fiquei com outra visão. Ela se emocionou falando da vida dela, do filho dela. Ficou tudo mais real.” Marcos Gomes ressalta a importância desse contato direto: “Muitos jovens viam a ditadura como algo distante, história antiga, até. Com a presença de Darcy, eles puderam ver como é algo muito mais próximo e como, ainda hoje, vivemos muitos resquícios desse período.”

Essa série de encontros continua. No dia 22 de maio, às 14h, no Ponto de Leitura do Galpão de Cultura e Cidadania do Jardim Lapenna, o convidado será Alípio Freire, jornalista e presidente do Núcleo de Preservação da Memória Política. Foi militante da Ala Vermelha entre 1967 e 1983 e esteve preso de 1969 a 1974. Além da Operação Bandeirante e do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), esteve no presídio Tiradentes, na Casa de Detenção do Carandiru e na Penitenciária do Estado de São Paulo.