O sarau Um Passe para a Arte e para a ArteCultura: sol e chuva na cidade sertão, no Galpão de Cultura e Cidadania, no Jardim Lapenna, em 7 de dezembro, e apresentações da peça O Mordomo, no CDC Tide Setubal, nos dias 6, 7 e 13 de dezembro, fecharam as atividades de 2013 do Núcleo Arteculturação, da Fundação Tide Setubal. Cerca de 160 pessoas, entre crianças, jovens e adultos, foram beneficiadas no ano, em oficinas de violão, percussão, luteria, coral e teatro.
“A autonomia e o protagonismo dos jovens para implantar projetos aprovados em lei, para encenar peças em praças e para circular em espaços da cidade por iniciativa própria, além do aumento da articulação com coletivos da região – como os de hip hop – e das intervenções nos locais que a Fundação administra, são os principais pontos positivos de 2013”, avalia Inácio Pereira dos Santos Neto, coordenador do Arteculturação.
Leitura de poemas e contos e apresentações de alunos de violão e percussão marcaram a manhã ensolarada do sábado, no Galpão de Cultura e Cidadania, que também contou com uma exposição de instrumentos produzidos pelos participantes da luteria. O sarau teve início com a leitura do microconto O Menino Azul, de Mário Quintana, a apresentação do resumo do livro Vidas Secas, de Graciliano Ramos, e a declamação de poemas pelo poeta e escultor Euflávio Goes Lima, de São Miguel. “Escolhemos o sarau porque ele nos permite ver vários tipos de arte. É uma grande troca de expressividades e de diversas formas de se comunicar: com a fala, o corpo ou a música”, explica o coordenador.
A seguir, os presentes assistiram à orquestra de violão: os alunos executaram Asa Branca, Luar do Sertão e Mulher Rendeira. Entre uma música e outra, adolescentes leram poemas de Cecília Meireles e de Luís de Camões. Um espaço foi reservado também à participação do projeto Vagalume, executado em parceria com a ONG homônima. No primeiro semestre, 15 adolescentes trabalharam a identidade e, no segundo, o meio ambiente. Eles se corresponderam, por carta, com estudantes da Amazônia, da mesma faixa etária; e um acampamento coletivo, no interior de São Paulo, marcou o encontro entre participantes do Norte e Sudeste.
O grupo de percussão tocou ciranda, baião, coco e samba reggae. Bastante emocionado, o professor de luteria Hudson de Cavalcanti optou por obras de Bach e próprias em seu violino e homenageou o integrante Eliseu, que é cadeirante, ressaltando que ele é um exemplo de superação. A seguir, Inácio leu o poema Caso Pluvioso, de Carlos Drummond de Andrade, em que uma mulher, Maria, desperta o amor em um homem.
Na sequência, o lutier David Souza Rocha tocou dois instrumentos que ele construiu: a harpa e a sinfonia medieval, uma caixa retangular, com manivelas e teclas, da qual se extrai som. O convidado Adriano Mauriz, do Grupo de Teatro Pombas Urbanas, de Cidade Tiradentes, entregou um livro para David e recebeu uma rabeca feita por ele. A troca comemorou simbolicamente as parcerias: em 2013, o grupo da zona leste participou, por exemplo, do Festival do Livro e da Literatura de São Miguel.
Teatro em evidência
Os alunos do grupo de teatro encenaram por quatro vezes a peça O Mordomo, no mês de dezembro, no CDC Tide Setubal, encerrando mais um semestre de atividades da trupe. O espetáculo foi criado por eles, após pesquisa de histórias de terror e suspense e a partir da literatura de Edgar Allan Poe e Stephen King e de obras do cinema de Alfred Hitchcock, Stanley Kubrick e Zé do Caixão. A busca desse apelo mais dramático partiu do próprio grupo, de acordo com o educador Marcos Gomes, responsável pelo módulo de teatro do Arteculturação.
No primeiro semestre, o trabalho havia caminhado mais na linha social, com o espetáculo Luzes Desiguais, criado a partir de depoimentos dos integrantes e que coincidiu com a aprovação da PEC das domésticas. “Ali, tínhamos dois amigos de infância, um filho da patroa e o outro, da empregada da casa. Ambos cresciam e se reencontravam como um policial, filho da empregada, e um advogado envolvidos numa trama de corrupção com dois finais possíveis. O público que decidiu se o policial aceitava ou não o dinheiro do advogado para não prender um corrupto”, conta Marcos. A peça também foi apresentada na praça do Forró, no Dia dos Pais.
Em O Mordomo, a plateia seguiu o personagem principal por uma mansão no dia de seu próprio velório. Assim, no espaço do CDC, aconteceram cenas de terror vividas por ex-moradores da casa que continuavam assombrando o local. Lucas Lima assumiu o papel do mordomo em três das apresentações. Desde 2011, ele está ligado ao núcleo de teatro do Arteculturação e conta que a irmã participava de um grupo, mas não sentia atração por essa arte até ir conhecer o núcleo.
“Quando vim ao CDC pela primeira vez, fiquei impressionado com as discussões sobre questões sociais, drogas, sexualidade, política. Entrei, fui estudando, assistindo a peças e me apaixonei.” Lucas foi um dos educandos que conseguiram aprovar, em abril de 2013, um projeto teatral no Programa VAI, da Secretaria de Cultura do município de São Paulo. “Agora que terminei o ensino médio, pretendo entrar em uma escola de artes cênicas. Estou fazendo testes para isso.”
No próximo semestre, a tendência é o grupo se apresentar num palco, sem itinerância pelo espaço cênico, como nas últimas montagens. Os participantes devem desenvolver texto, cenário, luz e figurino. Para Inácio Neto, essa autonomia é fundamental. “Experimentar novos temas, descobrir conteúdos de forma coletiva e colaborar com o próprio processo de aprendizado são características do trabalho desse núcleo e que acabam refletindo na atitude dos jovens. Neste ano que passou, eles próprios organizaram passeios culturais com Marcos, usando o transporte público, em busca de ampliar seus repertórios”, relata Inácio.
Recorde de empréstimos
Ao longo do ano até 11 de dezembro, o Ponto de Leitura do Jardim Lapenna, criado em 2009, e o do CDC Tide Setubal, aberto em 2012, parceria com a Secretaria Municipal de Cultura, também registraram resultados positivos. O primeiro somou o total de 5.170 empréstimos de exemplares, além de 10.852 visitas, enquanto o segundo contabilizou 1.563 empréstimos e 3.805 visitas. Os índices foram maiores do que os do ano anterior.
Em 2014, a principal meta do Arteculturação é mobilizar novos parceiros e recursos no território para que as iniciativas já realizadas possam ser consolidadas e para que o impacto delas seja mais efetivo. “Devemos intensificar as articulações junto aos grupos e aos coletivos culturais, visando ampliar a oferta de atividades socioculturais a partir de mais parcerias. Uma das ações será a criação de um projeto cultural que poderá oferecer apoio por meio de um edital”, afirma Inácio.